Teoria atual dos radicais livres
Não, você não leu errado. Uma nova pesquisa
científica concluiu que, ao contrário de tudo o que havia sido concluído antes,
os radicais livres
podem na verdade retardar o envelhecimento, ao invés de acelerá-lo.
A nova pesquisa dá um duro golpe na teoria de que
os radicais livres causam o envelhecimento, que tem dominado o mundo científico
há mais de 50 anos e que deu origem a uma multimilionária indústria de produtos
e terapias anti-envelhecimento.
A pesquisa, que acaba de ser publicada na revista
científica Proceedings of the National Academy of Sciences, foi
realizada por cientistas da Universidade do Minho, em Portugal.
Nova teoria dos radicais livres
Segundo a teoria atualmente aceita, os radicais
livres provocam danos oxidativos aos tecidos, e esta seria a causa do
envelhecimento.
O novo trabalho, no entanto, mostra que não só é
possível retardar o envelhecimento das células com altos níveis de oxidação,
mas ainda mais, que um radical livre (H2O2) está por trás da grande longevidade
obtida com as dietas de baixa calorias.
Então, reescrevendo as "verdades
científicas" anteriores, à luz das novas descobertas, tudo passaria a
ficar assim: as dietas de baixas calorias, um método eficiente para aumentar a
expectativa de vida,
aumentam um radical livre no organismo - mas isto é muito bom porque, ao
contrário do que se acreditava até agora, esse radical livre ajuda a proteger o
organismo do envelhecimento.
Mas a pesquisa tem um impacto mais amplo, porque os
resultados também afetarão o estudo de fenômenos tão diversos como as
inflamações, o Mal de Alzheimer e a morte celular - todos processos nos quais os
radicais livres desempenham algum papel.
Os cientistas afirmam que as novas descobertas, ao
aumentarem o conhecimento do que realmente acontece no organismo, darão à
medicina uma maior capacidade de lidar com o envelhecimento e, mais do que
estender o tempo de vida, tentar tornar esse tempo extra mais saudável e mais
ativo.
O que são radicais livres
Milhões de toneladas de produtos potencialmente
anti-envelhecimento são hoje fabricados e vendidos com base na teoria sobre o
papel dos radicais livres no envelhecimento, sustentando uma indústria
multimilionária.
Graças à sua apresentação ao público não como uma
teoria, mas como uma verdade científica, tornou-se conhecimento corrente do
público que os radicais livres são ruins e os antioxidantes são bons.
Mas será que eles realmente desempenham sempre
esses papéis?
Os radicais livres são átomos com elétrons
desemparelhados, o que os torna extremamente instáveis e prontos a ceder ou
capturar elétrons de outras moléculas, causando dano oxidativo nesse processo.
Isso
geralmente não é um problema em indivíduos saudáveis, já que os antioxidantes
naturais do corpo são suficientes para manter os radicais livres sob controle.
Mas coisas como o passar dos anos, o tabagismo e a poluição parecem aumentar a
produção e o acúmulo de radicais livres.
E é isto - além de um estilo
de vida pouco saudável - de acordo com a teoria do envelhecimento causada pelos
radicais livres, a razão pela qual se dá o envelhecimento, com uma rápida
deterioração dos tecidos e órgãos, ocasionando doenças e, eventualmente, a
morte.
Não está provado
O que os cientistas agora estão dizendo é que, de
fato, isto nunca foi provado. Embora se aceite que os radicais livres são
tóxicos, não há, de fato, nenhum trabalho experimental que dê suporte à teoria
do envelhecimento baseada nos radicais livres.
Segundo eles, mais e mais estudos sugerem que a
teoria é, na melhor das hipóteses, incompleta.
Exemplos dessas pesquisas que não se encaixam na
teoria vão da vida extremamente longa de animais de laboratório
(ratos-toupeira), que chegaram a viver até 28 anos com níveis elevados de danos
oxidativos (os ratos com baixa oxidação viveram 10 vezes menos), até a
descoberta de que o H2O2 - um dos principais radicais livres que se acredita
causar o envelhecimento - parece estar envolvido na química por detrás da
sobrevivência, e não da morte, celular.
Radicais livres contra o
envelhecimento
Estrutura molecular da
catalase, o antioxidante específico para o H2O2. [Imagem: ANCCT]
|
Na tentativa de compreender essas aparentes
contradições, o grupo da Dra Paula Ludovico estudou a levedura Saccharomyces
cerevisiae em uma dieta de baixas calorias.
Essas dietas (se não chegarem ao extremo) retardam
o envelhecimento, fazendo o organismo viver mais tempo, embora ainda não esteja
muito claro como exatamente isso acontece.
Eles estudaram também a vida mais longa dos
organismos acompanhada por elevados níveis de dano oxidativo, e centraram sua
atenção nos radicais livres peróxido de oxigênio (H2O2) e superóxido (O2-).
Mas, quando os pesquisadores procuraram sinais dos
radicais livres conforme a levedura vivia por mais tempo, eles foram
surpreendidos por algo inesperado: os níveis de radicais livres na verdade
aumentaram com o tempo de vida.
Eles também verificaram que a inativação de duas
proteínas antioxidantes, chamadas catalases, que são específicos para o H2O2 -
assim resultando em acúmulo de H2O2 na levedura - foi suficiente para que a S.
cerevisiae vivesse mais tempo mesmo sem precisar se submeter à dieta de
baixa caloria.
Os dois resultados sugerem que o H2O2 pode de fato
ser o responsável pelo aumento da longevidade.
Para confirmar esta possibilidade inesperada, a
levedura foi cultivada em um meio de H2O2 - e, de fato, ela passou a viver mais
do que o normal, provando que este radical livre pode realmente retardar o
envelhecimento.
Isto é particularmente interessante porque outros
pesquisadores já observaram o mesmo efeito com células da pele humana em
crescimento no H2O2, o que sugere que o papel anti-envelhecimento do H2O2 é
comum a muitas espécies diferentes.
Mas nem sempre
No entanto, com o superóxido O2- (o outro radical
livre associado ao envelhecimento), os resultados foram muito diferentes: à
medida que a longevidade das leveduras aumentou (devido a uma dieta de baixas
calorias ou pela inativação da catalase) o O2- desapareceu.
Os cientistas descobriram que isso ocorreu porque o
H2O2 ativou duas proteínas anti-oxidantes, desta vez específicas para o O2-
(chamadas SOD) e, conforme o H2O2 aumentou, o O2- foi neutralizado.
Dano oxidativo
E sobre o dano oxidativo, que, segundo a teoria dos
radicais livres, é diretamente responsável pelo envelhecimento?
Novamente um resultado inesperado - de fato, embora
o fermento que viveu mais sob uma dieta de baixas calorias mostrasse menos
sinais de danos oxidativos conforme vivia mais (de acordo com as previsões da
teoria), o mesmo não aconteceu com aqueles sem catalases.
Na verdade, nessas leveduras sem catalases, ocorreu
o oposto, com o dano oxidativo aumentando à medida que o fermento vivia mais
tempo.
Então, como podemos explicar a capacidade de
proteção do H2O2 quando se sabe que este radical é tóxico, matando as células?
Segundo a primeira autora do artigo, Ana Mesquita,
a explicação está em um fenômeno chamado hormese, no qual uma substância
normalmente tóxica pode ter efeitos benéficos se utilizada em doses baixas -
reforçando o conhecido ditado de que a diferença entre o veneno e o remédio é a
dose.
Por que isso acontece não é algo totalmente claro,
mas suspeita-se que pequenas quantidades de estresse (como pequenas quantidades
de H2O2) possam ativar os mecanismos de reparo do corpo, sem realmente provocar
qualquer dano, acabando assim por ter um "bizarro" efeito benéfico.
Neste caso, o H2O2 é suficiente para ativar os
antioxidantes específicos para o O2-, retardando o envelhecimento normalmente
provocado por este radical livre.
Radical livre anti-envelhecimento
Em conclusão, o novo estudo de Ludovico e seus
colegas tem alguns resultados cruciais.
O primeiro é que é possível ter pouco dano
oxidativo apesar de se ter altos níveis de radicais livres (H2O2 na levedura
com uma dieta pobre em calorias).
Em segundo lugar, que altos níveis de dano
oxidativo podem ocorrer em organismos que vivem mais (como ocorre na levedura
sem catalase funcional).
Finalmente, na descoberta que coloca de cabeça para
baixo a maneira como vemos as pesquisas e as terapias anti-envelhecimento, o
trabalho comprova que um radical livre (o H2O2) pode realmente ser um radical
anti-envelhecimento.
A pesquisa mostra que a relação entre radicais
livres e envelhecimento não é tão simples quanto estabelece a conhecida equação
radicais livres = dano oxidativo. Contudo, por ter se concentrado em
apenas dois radicais livres, novas pesquisas serão necessárias para verificar a
amplitude dos efeitos.
E isso afetará a indústria de anti-oxidantes? Muito
provavelmente não. Afinal, nunca houve qualquer evidência científica de que
suplementos anti-oxidantes afetassem os níveis dos radicais livres no organismo
(apesar do que a indústria quer que acreditemos), e, ainda assim, milhões de
pessoas continuam a comprar essa promessa elusiva de prorrogação de vida. No
fim das contas, é tudo uma questão de esperança (pelo menos por enquanto ...).
http://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=radicais-livres-tem-efeito-antienvelhecimento&id=5801
No comments:
Post a Comment