Diante das críticas à "importação" de cubanos para reforçar o
programa Mais Médicos, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que
profissionais da ilha de Fidel Castro podem ensinar aos colegas
brasileiros "o compromisso com os mais pobres e com os que mais
precisam". Em entrevista ao Estado, minimizou a
exigência de Cuba de abocanhar mais da metade dos rendimentos dos
médicos e sentenciou: o salário não é o mais importante
"Esse contato com médicos que vêm para cá, cuja felicidade também é
construída por outras motivações, vai ser muito positivo para o Sistema
Único de Saúde", previu Padilha.
Pré-candidato do PT ao governo de São Paulo, devoto de São Jorge e
corintiano roxo, o ministro da Saúde tem em seu gabinete imagens do
"santo guerreiro" e revive agora os tempos de articulador político do
Planalto, cargo que exerceu na gestão Lula. Toma café da manhã com
deputados, almoça com prefeitos e janta com senadores, mas diz que a
caça aos votos é para aprovar o Mais Médicos até novembro.
Nesse cenário, Padilha não deixou passar em branco as críticas feitas
ao programa pelo governador Geraldo Alckmin, candidato do PSDB à
reeleição. "É uma profunda insensibilidade com o sofrimento do povo",
rebateu ele.
O governador Alckmin afirma que não faltam médicos, mas
financiamento. Como o senhor responde? É uma profunda insensibilidade
com o sofrimento do povo não reconhecer que faltam médicos no Brasil. É
só ver as dificuldades da população na periferia, nos municípios do
interior.
Virão mais médicos cubanos além dos 4 mil já acertados? Estamos
analisando o ritmo de inscrições individuais de médicos brasileiros e de
outros países. Temos a expectativa de que vai aumentar. Vamos usar
todas as estratégias para garantir o atendimento a milhões de pessoas
que não têm médico.
Incluindo outro acordo? Vamos avaliar a execução do acordo com Cuba.
Pretendemos buscar outras parcerias, como ONGs que têm interesse em
assumir determinadas regiões. No Haiti, trabalhamos com a Pastoral da
Criança e grupos expedicionários de médicos.
O acordo com Cuba é comparado à escravidão... Estamos fazendo uma
parceria com o braço da ONU para saúde nas Américas (a Opas) com termos
semelhantes aos de outros 58 países. Nunca houve uma comparação como
essa.
E o envio de parte do salário para o governo cubano? Gostar de médico
cubano e reconhecer a competência não significa concordar com as
características do regime político de Cuba. O que me move como ministro é
trazer médico para a população. A chegada desses profissionais vai
demandar novas questões, provocará uma mudança no SUS. Um médico afirmou
que os cubanos viriam para cá felizes. Muito bom. Eu quero médicos bons
e felizes para atender o povo.
Mas esse médico cubano naturalizado brasileiro (Carlos Rafael, que
prestou depoimento na Câmara, na quarta-feira) também disse que o
governo sujaria as mãos de sangue... Acho que essa afirmação é de quem
está mais preocupado em debater o regime político de Cuba do que em ver
como suprir o atendimento médico a milhões de brasileiros. Temos acordos
com Cuba na área há anos. A excelência na atenção básica de Cuba nos
ajudou a reduzir a mortalidade infantil, ampliar a vacinação, combater
epidemias. Hoje temos parcerias que envolvem descobertas tecnológicas e a
oportunidade de trazer médicos com experiência no atendimento em área
de extrema vulnerabilidade social.
É possível ser feliz mandando mais da metade do salário para o
governo cubano? Não podemos comparar nossa realidade com outras. Na
Europa, quase metade do salário do médico fica como imposto e ele é
feliz por isso, porque tem saúde e educação como retorno. Vários
espanhóis e portugueses vêm para cá porque estão desempregados. O Mais
Médicos nos ajudará a ver que também os médicos brasileiros não são só
motivados pelo que ganham. Esse contato com médicos que vêm para cá,
cuja felicidade é construída por outras motivações, será muito positivo
para o SUS.
Por que o Brasil mudou de posição em relação à concessão de asilo
para os cubanos? Não há mudança de posição. Se o médico estrangeiro for
desligado do programa por qualquer motivo, como não cumprimento da carga
horária, ou concluir os três anos de trabalho e quiser ficar no Brasil
para casar, por exemplo, isso será avaliado.
O senhor não teme que haja um pedido de asilo em massa e que isso
possa prejudicar as relações com Cuba? Não trabalho com hipóteses. Minha
prioridade é trazer médico.
O que o senhor achou da reação da classe médica? Alguns grupos
tiveram uma reação que reforça a visão preconceituosa, de xenofobia, de
truculência. Não só com o médico que vem de fora, mas em relação ao
médico negro. Ouvimos "voltem para senzala". Precisamos de uma escola
que integre os médicos aos outros profissionais, como enfermeiros e
psicólogos. Ele não pode ser visto como se fosse de um estamento
diferente no hospital.
Seus adversários dizem que o Mais Médicos foi montado às pressas,
para criar uma marca no governo Dilma e inflar sua candidatura ao
governo de São Paulo. O programa foi pedido por todos os prefeitos, de
todos os partidos. Prefeitos do PSDB e do DEM pediram esse programa para
criar uma marca para a presidente Dilma? Não acredito nisso. Isso é um
problema real dos municípios.
Há muita resistência no Congresso. Como o senhor fará para
neutralizar essas dificuldades num momento em que a articulação política
do governo Dilma enfrenta uma crise? Estou fazendo meu trabalho
permanente de formiguinha no Congresso. Já fui ministro das Relações
Institucionais (governo Lula) e vou buscar os votos para que a gente
possa aprovar essa medida provisória. Converso com as bancadas para
tirar dúvidas e ouvir sugestões.
Será possível transformar a residência em pré-requisito para a
contratação de médicos pelo SUS e até mesmo por universidades públicas? O
centro da proposta é criar uma situação na qual o formado, que está na
residência, passe um período maior no SUS, na atenção básica e na
urgência e emergência. Isso provocará uma profunda mudança na formação
do profissional. O debate no Congresso é como transformar esse ponto em
uma regra jurídica, pois nem todo médico é obrigado a fazer residência.
O que o médico cubano tem a ensinar ao médico brasileiro? O
conhecimento da atenção básica, a cultura da prevenção e o compromisso
com os mais pobres. Essa troca será positiva não só para o médico do
Brasil como para os outros profissionais. Não tenho dúvida de que a
presença desses médicos, de segunda a sexta, nas Unidades Básicas de
Saúde, ajudará a moralizar o cumprimento da carga horária no SUS.
Quando o senhor vai deixar o Ministério para começar a campanha ao
governo de SP? Não discutimos isso. Nossa atenção está voltada para o
Mais Médicos. Esse é um programa que gera preocupação e ganhou um
carinho muito grande da presidente Dilma. Quase diariamente ela checa a
atuação do programa e nos cobra.
Com que partidos o senhor pretende fechar alianças para sustentar sua
candidatura? O único voto que estou caçando agora é para aprovar o Mais
Médicos no Congresso (risos).
do Haddad.
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,cubanos-tem-muito-a-ensinar-diz-ministro-,1072444,0.htm
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