O que gera a eletricidade estática?
Fenômenos eletrostáticos desafiam filósofos e cientistas
desde que Tales de Mileto, por volta de 600 a.c, esfregou um pedaço de
âmbar com lã e constatou que a resina petrificada atraía pedacinhos de
palha.
Este simples experimento ainda não é bem compreendido pela ciência, e
não existem teorias que expliquem efetivamente esse fenômeno.
Mas ele tem um nome: triboeletricidade.
E suas consequências podem ser catastróficas, como o incêndio do
dirigível Hindenburgo, em 1937, ou o acidente com o Veículo Lançador de
Satélites (VLS-1 V03), no Maranhão, em 2003.
Por outro lado, apesar da limitação científica, várias
tecnologias eletrostáticas são usadas com sucesso, como as de
fotocopiadoras e impressoras a laser, a pintura eletrostática, a eletrofiação e a reciclagem de plásticos.
Eletrostática
A eletrostática é normalmente considerada como sendo uma disciplina
da física, mas os métodos aplicados ao seu estudo não tem produzido boas
soluções.
Muitos pesquisadores e engenheiros vêm tentando explicar a separação
de cargas elétricas que produz a triboeletricidade como resultado da
transferência de elétrons, mas isso só foi demonstrado no caso de metais
e semicondutores.
Nos sistemas vivos, a eletrização é consequência da transferência de
íons.
No caso dos materiais isolantes, como os plásticos, vidros e
cerâmicas, não se sabe quais são as entidades portadoras de cargas e nem
como essas cargas são transportadas de uma superfície para outra quando
esses materiais adquirem carga elétrica estática.
"Em nanotecnologia, o problema é ainda mais grave: quando se
reduz a escala, o efeito da carga estática se torna maior que o do
peso", diz Fernando Galembeck, diretor do LNNano (Laboratório Nacional de Nanotecnologia) e do Inomat (Instituto Nacional de C,T&I em Materiais Funcionais).
"Utilizando a microscopia de transmissão associada à espectroscopia
de perda de energia de elétrons e à microscopia Kelvin, constatamos que
partículas de látex, que sempre foram tratadas como elementos neutros,
são de fato multipolos elétricos", lembra Galembeck.
Ao longo de mais de dez anos, o grupo analisou cerca de 100 amostras
para concluir que, em escalas nanométrica e micrométrica, isolantes
sempre apresentam domínios com excesso de cargas positivas e negativas,
lado a lado.
"A regra não é a eletroneutralidade", enfatiza o diretor do LNNano.
Participação do ambiente
As pesquisas avançaram com a utilização de pastilhas de silício
recobertos com sílica e tiras de ouro, formando um conjunto de eletrodos
interdigitados.
"Medimos o comportamento da amostra com diferentes percentuais de
umidade e constatamos que a sílica adquire carga negativa quando a
umidade se aproxima de 70%", lembra Galembeck. "Confirmamos que, ao
mudar a umidade, muda também o grau de eletrização e concluímos que a
atmosfera participa do processo de troca de carga."
Agora em 2012, o grupo publicou uma nova descoberta: mapas de carga
de amostras de PTFE (politetrafluoroetileno) atritadas contra outras de
polietileno mostram regiões macroscópicas com excesso de cargas
negativas e positivas formadas por resíduos de PTFE negativos e resíduos
de polietileno, positivos.
Teoria sobre eletricidade estática
Como entender essa separação de carga nos dois materiais?
O mecanismo proposto pelos pesquisadores brasileiros considera, em
primeiro lugar, que o atrito entre duas superfícies de polímeros provoca
a extensão das cadeias de átomos da superfície dos plásticos.
Algumas cadeias se rompem formando radicais livres, que são as
terminações das cadeias com elétrons desemparelhados. Estes radicais são
instáveis e tendem a formar outras substâncias e uma das possibilidades
é a transferência de um elétron dos radicais que tem menor afinidade
por elétrons (os do polietileno) para os que tem maior afinidade, que
são os do PTFE.
Dessa forma, os radicais de polietileno transformam-se
em íons positivos e os do PTFE em íons negativos. As cargas opostas dos
íons tendem a se atrair, mas estão presas a grandes cadeias poliméricas
que são sempre imiscíveis, segundo a teoria de Flory, das soluções de
polímeros.
Portanto, as cargas positivas acumulam-se em uma região da amostra e as negativas em outra região, contígua.
Embora não seja a palavra final sobre a triboeletricidade e os
desafios que o fenômeno impõe para a nanotecnologia ou para as
macrotecnologias, a teoria está chamando a atenção de pesquisadores da
área em todo o mundo.
Depois de ser publicado em revistas científicas e apresentado em
vários congressos internacionais, a proposta dos brasileiros constou
como uma das mais importantes na área da triboeletricidade em um
trabalho chamado "O que cria a eletricidade estática?" publicado pela
revista American Scientist.
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