Diretor da Faculdade da Santa Casa, ex-diretor da FMUSP e conselheiro discutem Exame do
Cremesp
A seguir
apresentamos um debate sobre o Exame, para o qual o Cremesp convidou os
professores doutores Ernani
Geraldo Rolim, diretor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo,
professor adjunto do Departamento de Clínica Médica e chefe da Clínica de
Gastroenterologia da mesma instituição; e Giovanni Guido Cerri,
ex-diretor e titular do Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da
USP, além de presidente da World Federation for Ultrasound in Medicine and
Biology. O encontro foi mediado pelo conselheiro e diretor de Comunicação Bráulio
Luna Filho. Acompanhe um resumo das discussões:
Luna: O que move o Cremesp a fazer esta discussão é a preocupação que sempre teve com a boa formação dos médicos. Para iniciar este debate gostaria de saber qual é a avaliação que os senhores fazem sobre o ensino médico no país?
Cerri: Como em todo o mundo, o ensino deve estar lastreado
pelo hospital universitário como um complemento fundamental para a formação
médica. Mas temos no país escolas de muito bom nível, com modelos modernos e
atuais, e outras insuficientes, com estrutura hospitalar e ensino básico que
deixam a desejar. O Brasil é um país de contrastes, temos do muito bom ao muito
ruim. Também continuamos em um grande impasse em relação à distribuição
inadequada de escolas médicas no país.
Rolim: Nessa explosão de novas escolas não se vêem cuidados
relacionados ao hospital universitário e a um corpo docente experiente. Não basta
ter titulação, é preciso ter experiência também. Participei da inspeção de
algumas escolas que estão sendo criadas no país e tive a oportunidade de ver
que muitas não satisfazem às exigências básicas de ensino, o que é muito
preocupante.
Luna: Hoje o Brasil tem 172 escolas médicas autorizadas
pelo Ministério da Educação (MEC), 31 delas no Estado de São Paulo. Preocupados
com essa questão, nós, do Cremesp, fizemos no ano passado um levantamento dos
instrumentos de educação oferecidos por essas instituições e uma análise
pormenorizada da situação de todos os serviços de saúde onde há alunos de
Medicina. Lamentavelmente, constatamos que mais de 60% deixam a desejar em
requisitos básicos – faltam bibliotecas, orientadores e muitas vezes o interno
fica sozinho nesses serviços. Entre as escolas médicas autorizadas
recentemente, muitas apresentam um currículo sofisticado de treinamentos com
bonecos e monitores. Os senhores acham que isso substitui o professor ensinando
ao aluno na beira do leito?
Cerri: A infra-estrutura é importante e ajuda, mas o
professor experiente e qualificado é um instrumento fundamental, tanto no
ensino básico quanto no clínico. Algumas escolas enfeitam a sua
infra-estrutura, mas não é isso que forma o médico adequadamente.
Rolim: O ensino caminha muito por essa ponte tecnológica,
esquecendo-se do fundamental.Venho de uma escola tradicional e aprendi que
Medicina se faz examinando e sentindo o paciente. Trocando isso por um boneco,
cria-se a falsa impressão de se estar ensinando – o que não deixa de acontecer,
mas com deficiência.Vejo com muita preocupação os projetos de ensino pedagógico
que seguem essa linha.
Luna: A maioria das escolas novas
propõe-se a uma “a fórmula inovadora” de ensino, apregoando um maior
envolvimento do estudante, o desenvolvimento de sua capacidade crítica, baseada
em algumas experiências internacionais de PBL (Problem
Based Learning) etc. Porém, observamos que não há
superioridade se comparados aos métodos tradicionais de ensino. É um certo
modismo todas as escolas modernas terem esse tipo de fundamentação? Parece que
isso impressiona o pessoal do MEC, não é?
Cerri: É importante incorporar as inovações, faz parte da
evolução do ensino – que às vezes anda em círculos, passando por várias
experiências e retornando à inicial –, mas essa fórmula revolucionária de
formar bons médicos não existe. É claro que entre escolas de caráter mais
comercial a impressão de que estão fazendo algo inédito e revolucionário é um
bom instrumento de marketing. É válido que as escolas tradicionais incorporem
as inovações de ensino, mas sem deixar de lado o conhecimento acumulado ao
longo de décadas. Temos no Brasil excelentes médicos de nível internacional
formados pelo modelo tradicional.
Rolim: É preciso aguardar um pouco para fazer a avaliação do
PBL, visto que as primeiras turmas formadas por esse modelo começaram suas
atividades nos últimos dois anos. Porém é fato marcante da literatura
internacional que não há realmente predomínio de um método pedagógico sobre
outro. Há de se respeitar o pendor do corpo docente da escola e a excelência de
seus mestres, aspectos que não podem ser ignorados ou trocados por uma nova
fórmula de ensino representada no papel. A escola que pretende elaborar um
projeto pedagógico desse tipo deve ter uma equipe muito especializada, ou não
consegue atingir seu objetivo.
Luna: Venho de uma escola tradicional, a
Universidade Federal da Bahia, tenho quase 30 anos de formado e o que me
impressionava nos meus professores, além do conhecimento técnico era a cultura geral
que eles tinham. Eram pessoas que impressionavam pela postura e a maneira como
colocavam os problemas éticos, demonstrando conhecimento e segurança em suas
explanações. Hoje, o ensino está muito voltado à tecnologia. Claro que houve um
grande avanço tecnológico que precisa ser incorporado ao ensino. Mas os
senhores não acham que há um exagero e que deveríamos trazer mais à discussão
os aspectos humanistas do ensino médico?
Cerri: Isso é fundamental porque a formação de um médico com
visão puramente técnica não é adequada. O médico não é um técnico. Ele deve ter
conhecimentos técnicos, mas o exercício profissional é fundamentalmente baseado
na relação médico-paciente. Os aspectos humanísticos, o conhecimento global e
mais amplo de mundo são importantes para que o médico possa se relacionar com o
paciente. Esse caminho que as escolas médicas, incluindo as tradicionais,
seguiram nas últimas duas décadas de ênfase técnica, esquecendo-se da formação
global e dos valores humanísticos foi um equívoco e seu resgate tem de ser
feito. A convivência pelo centro acadêmico, as atividades esportivas, o teatro
e a leitura fazem parte da formação de um bom médico. Claro que vamos ter o
médico pesquisador que trabalha em laboratório, mas não é esse que estamos
formando. O médico deve ser formado para conviver em sociedade com espírito
crítico, visão da realidade do país, das diferenças sociais, da necessidade de
contribuir para a melhoria da saúde e redução da desigualdade.
Rolim: Eu também conjugo dessa idéia. Descarrega-se muito na
tecnologia e pouco na relação médico-paciente, o que faz com que a Medicina
encareça, o que tem levado a uma deficiência no atendimento. Se o paciente
queixa-se de dor no abdome, o médico pede logo uma ultra-sonografia; e, se está
tossindo, faz uma tomografia. É evidente que esses exames têm seu espaço, mas
no momento certo.
Luna: O Conselho vem se debruçando
intensamente, nos últimos quatro anos, na Avaliação dos Egressos de
Medicina, de forma que se possa verificar a qualidade dos recém-formados. Temos
discutido sobre isso, sabendo que é um assunto polêmico em que há
controvérsias, mas é necessário avaliar e analisar a qualidade dos
profissionais. Nos três exames já realizados pelo Conselho, os resultados nos
deixaram extremamente preocupados. Quando comparados com outros países, que têm
o mesmo empenho em formar médico de qualidade (e alguns deles, inclusive,
realizam o exame na fase final do curso) os resultados são melhores. O que está
acontecendo com as nossas escolas? Elas não estão avaliando? O sistema de
avaliação não funciona?
Rolim: Desde o tempo em que fui conselheiro do Cremesp
(gestão 1988/93), já tínhamos a idéia de desenvolver algo que permitisse
avaliar o produto final das escolas médicas. Na época houve muita crítica,
boicote e acabou não acontecendo. O Rio Grande do Sul fazia esse tipo de exame
naquela ocasião e se falava que havia valor nessa iniciativa, porque devolvia
às escolas informações importantes sobre a formação dos alunos. Acho válido
esse tipo de proposta, seja por iniciativa do Cremesp, do Ministério de
Educação ou de associações médicas. A avaliação interna que nós fazemos é
defeituosa. Mesmo que todos os alunos sejam aprovados, muitos passam por média
mínima e, quando fazem um exame fora da escola, demonstram que não estão bem
formados. A avaliação externa é muito boa nesse sentido. Só podemos ter
informações sobre o que acontece com os nossos ex-alunos se recebermos esses
dados, isso ajuda bastante a escola. Agora, eu teria algumas sugestões no
sentido de melhorar o Exame do Cremesp. O convite do Cremesp a todos os
diretores de escolas para que acompanhem o exame é uma iniciativa muito
democrática e procura ter a melhor intenção possível. O exame deve ser
incentivado, tem prós e contras, mas uma avaliação externa é sempre vantajosa.
Cerri: É muito difícil entrar numa boa escola médica e muito
fácil sair. Apesar de a
escola ter alunos muito bons e intelectualmente bem preparados, não é possível
que em seis anos não existam desvios. A avaliação ao longo do curso é um problema geral das
escolas médicas. Há um certo paternalismo; reprovar um aluno é algo tão
aviltante que ninguém pode ser reprovado e temos que carregá-lo no colo até o
final. Aliás, um dos grandes problemas do país é que somos uma sociedade muito
permissiva e tolerante, mas para as escolas obterem melhores resultados
devem fazer uma avaliação rígida e exigir mais qualidade. O exame do Cremesp mostra que o
produto final das nossas escolas deixa a desejar. Devemos considerar também que
uma boa parte dos alunos do sexto ano se dedica mais ao cursinho preparatório
para a Residência Médica do que à faculdade. Ou seja, esses dados podem
estar um pouco falseados, pode ser que o resultado seja pior. Isso mostra que
temos de promover grandes mudanças. Porém, defendo que essas mudanças devem ser
promovidas pela própria escola médica. E temos de ser mais exigentes em relação
à abertura de escolas e fechar aquelas que não oferecem educação adequada. Temos de reformar o ensino
médico do país. Essa deve ser a grande revolução para poder dar tranqüilidade à
população – que o médico que está saindo da faculdade tem uma boa formação,
independente da escola.
Luna: O Cremesp é contrário à abertura
indiscriminada e sem critérios de escolas médicas. Mas não somos contra a abertura
criteriosa porque há regiões do país que precisam de médicos. Entretanto, o
Conselho não conseguiu nenhuma ressonância nessa luta no início, e somente
passou a ser ouvido quando começou a discutir a possibilidade de avaliar os
recém-formados. E aí, senhores, entramos em um terreno que incomodava vários
setores da sociedade organizada, inclusive pessoas ligadas às escolas de
altíssimo nível. Essa luta foi árdua o que nos custou muito, mas teve uma
resposta social impressionante. Segundo pesquisa feita pelo Instituto Datafolha
entre 2005 e 2006, apóiam o Exame de Avaliação do Cremesp 84% dos médicos e 94%
da população. Além disso, 100% dos chamados formadores de opinião consideram o
exame fundamental. E mesmo entre os alunos, cerca de 45% aprovam e acham
importante fazer esse exame. Ou seja, há uma reflexão de que se for deixado por
si, as escolas não vão mudar esse quadro. Inclusive, acolhemos a experiência
feita por esta Casa na época em que o Rolim era conselheiro e, também, do exame
da Cinaem, que trabalhou nessa direção. Esses trabalhos não surtiram efeitos
diretos na melhoria das escolas de Medicina, mas tiveram efeitos colaterais. Os
senhores acreditam que é possível avançar nesse sentido sem a obrigatoriedade
de uma avaliação externa final para saber se o recém-formado está apto a
exercer a Medicina?
Rolim: Não tenho dúvidas de que o exame já deveria estar
sendo realizado há 20 anos. Mas permitiu-se a perpetuação dessa situação ruim
com a agravante explosão de novas escolas. Se há 20 anos já havia oposição a um
exame externo, inclusive com ameaça de intervenção, hoje ela é evidentemente
maior. O Cremesp está expondo uma realidade que não é confortável para muitas
escolas. Mas só é possível avaliar a escola se houver a participação
representativa de alunos na prova. Seria preciso fixar essa participação em no
mínimo 60 ou 70% dos egressos. Se em um exame voluntário participam apenas os
20 mais dedicados de uma classe de 120 alunos, vamos produzir um erro muito
sério. Por outro lado, só se entende um diagnóstico quando seguido de uma
proposta terapêutica. Se a escola não está bem, o que pode ser feito para
melhorá-la? O objetivo não é fechar, mas ajudar. Com um instrumento desse tipo
é possível que o diretor de uma escola que não foi bem avaliada procure
convênios com a USP, por exemplo.
Luna: O exame do Cremesp, até então, tem
sido voluntário. Isso tem feito com que algumas escolas apóiem o exame e outras
não, e que seus alunos participem ou não. Isso cria uma dificuldade de análise,
porque em determinado ano temos a participação da maioria dos estudantes de
algumas instituições e, em outro ano, uma minoria. Apesar dessa ocorrência,
contamos com a participação média de 40 a 45% do universo de recém-formados em
Medicina, o que é importante para uma amostra. Isso nos tem dado licença para
fazer comentários sobre a qualidade do ensino em geral; e não em particular, de
algumas escolas. O fato de o exame ser dividido em módulos – de Clínica Médica,
Ginecologia, etc –, permite identificar, dentro da amostra, em quais matérias
os estudantes têm deficiências. E temos remetido esses resultados às escolas.
Lógico que no início tínhamos um problema crucial: que tipo de prova fazer?
Porque não é uma prova de competição, mas de avaliação. Tudo isso faz com que
sejamos cautelosos na hora de generalizar os resultados. Mas o Rolim tem razão,
precisamos aprimorar nossa avaliação. E gostaria de esclarecer que temos
evitado qualquer proposta de ranqueamento, estamos avaliando o ensino com toda
crítica e parcimônia, tentando entender a necessidade ou não de sua
reformulação dentro da escola.
Cerri: O
exame do Cremesp expõe uma ferida que já desconfiávamos existir. Sabemos
que a qualidade do ensino médico é deficiente em muitas escolas e os resultados
não surpreendem, apenas comprovam em números a gravidade do problema. A questão
é como avançar em relação à cura do problema? Os últimos resultados do Exame do
Cremesp mostram que as escolas não estão melhorando, ao contrário. Não vejo a
preocupação, em algumas escolas, de investir em mudanças e melhorias e temos
muita responsabilidade no sentido de apresentar soluções ao problema. Os alunos
que vêm de escolas mais fracas estão desestimulados a participar do exame.
Embora o Cremesp não busque um ranking das melhores escolas, deveríamos
estimular aquelas que não apresentaram bons resultados a melhorar seu
desempenho. Teria de ser um esforço coletivo, com a participação das escolas
que têm mais recursos, do Cremesp e da sociedade. É preciso contribuir para que
essa melhoria ocorra e não permitir que médicos sem formação cheguem ao
mercado.
Rolim: Quando o MEC esteve em nossa escola e mostrou a
necessidade de uma série de mudanças, eu, na condição de diretor, ganhei força
para conseguir implementá-las. Quando se mostra que a situação não está
adequada, o coordenador, o diretor e o corpo docente atuam no sentido de
melhorar. Mas se ninguém aponta ou ninguém fica sabendo, o problema tende a
persistir.
Cerri: Deveríamos englobar a Residência Médica na formação
do médico – ela é parte fundamental. O curso de seis anos é insuficiente para
formar um médico e as escolas deveriam estar obrigadas a fornecer vagas de
Residência Médica. Além disso, esta avaliação do desempenho poderia ser estendida
ao curso básico, ao internato e depois à Residência Médica, para localizarmos
onde está o problema.
Luna: O curso médico nos Estados Unidos é
de quatro anos, depois tem um ano de internato. Mas ninguém entra no
mercado com um ano de internato, depois disso eles fazem uma prova em três
níveis. E, depois, entram na Residência Médica. Sem isso eles não têm a mínima
chance de ingressar no mercado de trabalho. Na Inglaterra, Espanha e outros
países é a mesma coisa. No Brasil estamos atrasados para essa tendência, a
Residência Médica já deveria ser obrigatória para a entrada no mercado de
trabalho.
Cerri: Os Conselhos de Medicina poderiam discutir em que
momento conceder o registro profissional. Com esses resultados do exame,
registrar um profissional formado por algumas escolas é uma temeridade. Talvez
a concessão do registro após a Residência Médica fosse uma maneira de exigir
formação mais adequada. Claro que em alguns casos se poderia abrir exceções,
por exemplo para o médico que será pesquisador. Talvez um caminho seria buscar
alguma mudança na legislação que permita controlar melhor o exercício
profissional. Vamos ser realistas, dá para um médico recém-formado praticar
neurocirurgia? Eu acho que não dá nem para praticar Ginecologia ou Clínica Geral
ou participar do Programa de Saúde da Família. Então, por que registramos esses
médicos?
Luna: A dúvida que fica é a seguinte: seria suficiente simplesmente ampliar o curso médico, incorporando a necessidade de Residência e adiando a entrega da autorização para o exercício pleno da profissão? Devemos propor isso ou, em função da grande dificuldade de mudanças na legislação, fazer um exame como o do Cremesp, em nível nacional, como condição para a outorga do diploma?
Luna: A dúvida que fica é a seguinte: seria suficiente simplesmente ampliar o curso médico, incorporando a necessidade de Residência e adiando a entrega da autorização para o exercício pleno da profissão? Devemos propor isso ou, em função da grande dificuldade de mudanças na legislação, fazer um exame como o do Cremesp, em nível nacional, como condição para a outorga do diploma?
Rolim: A idéia de postergar o registro – dentro da concepção
de que a Residência complementaria razoavelmente o padrão do médico – é boa,
mas cairíamos no mesmo problema. Existem boas residências e outras que não são
tão boas assim. O problema é complexo, mas é evidente que algo precisa ser feito
e não pode ficar como está, temos de estudar a terapêutica apropriada
Luna: As escolas devem ter maior
responsabilidade na avaliação, fazê-la de maneira mais científica e técnica –
ela não pode ser feita como antigamente, pelo acompanhamento, porque o contato
entre o professor e o aluno reduziu-se ao longo dos anos. Outro ponto
fundamental é que a escola faça uma avaliação terminal para saber se libera o
aluno ou não.
Cerri: Eu não sou um entusiasta de um exame nos moldes da
OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que é extremamente deficiente.
Basicamente, a sociedade e o Governo encaram da seguinte forma: “não vamos mais
nos preocupar com as escolas porque, mais adiante, um exame dirá quem pode ou
não exercer a profissão”. E houve uma grande proliferação de faculdades de
Direito, sem nenhum controle. O exame da OAB não resolveu nada, ao contrário,
prejudicou mais a imagem da profissão. Acho que um exame final de avaliação
nacional pode até ser feito em algum momento futuro, mas a preocupação em
tratar a doença tem de acontecer dentro da escola. Ou vamos apenas tratar os
sintomas e não as causas.
Rolim: Tenho
conversado com o pessoal da OAB que faz o seguinte alerta: “não deixem
acontecer o que aconteceu conosco, que começamos a cuidar do problema tardiamente”.
Eles avaliam que o exame cumpriu o seu papel e que seria muito pior para a
carreira dos advogados se ele não fosse aplicado. O problema é que a legislação
brasileira é muito frouxa, sendo fácil abrir escolas. É preciso atacar em
várias frentes e concordo que não podemos nos concentrar no exame, esquecendo a
responsabilidade social da escola médica. O grande perigo está no escape do
cursinho, como acontece com o exame de Residência Médica. Podemos criar uma
situação que escape para uma solução que não é a melhor – como na OAB, onde
quem termina a faculdade e não passa no exame vai para o cursinho. Na Santa
Casa já temos seis anos de experiência de realização do exame final global para
todos os alunos. Fazemos uma prova de fixação do conhecimento, na qual os
alunos do sexto ano respondem às questões das disciplinas dos seis anos; e, no
quinto ano, dos cinco anos para trás; e assim sucessivamente. Essa prova mostra
resultados interessantes. Quando o aluno está em determinado ano do curso,
dedica-se mais intimamente a tal disciplina e tira nota suficiente para ser
aprovado. Mas quando ele faz uma avaliação global no final, a coisa muda. Quem
alcançava nota nove ou dez, acaba conseguindo cinco ou seis na prova
globalizada.
Cerri: Recentemente discutimos a questão da reformulação do
ensino em um congresso, no qual levantaram-se três mudanças necessárias: que as
escolas fossem obrigadas a fazer uma avaliação séria ao longo do curso; que
passassem a fornecer pelo menos 50% das vagas de Residência Médica e que a sua
infra-estrutura fosse sistematicamente avaliada. E sentimos boa receptividade
na busca de mudanças na legislação, tanto que em fevereiro de 2008 vamos reunir
as frentes parlamentares de saúde na Faculdade de Medicina da USP para discutir
essa proposta. Vamos promover um debate com a sociedade, com os parlamentares,
Ministério da Saúde, da Educação, além das escolas médicas públicas e privadas,
de forma que possamos tirar uma proposta de legislação em torno do que as
escolas estariam obrigadas a cumprir. Esse seria o primeiro passo; o segundo
deve estar na contribuição coletiva das boas escolas para assessorar e ajudar a
melhorar o que existe. E os conselhos podem trabalhar um pouco na questão da
regulação e nas mudanças da legislação. Desde a instituição dos Conselhos no
país, a Medicina sofreu grandes tranformações. Quando os Conselhos passaram a
registrar o diploma, não existia a Residência Médica, mas agora existe; e a
formação do médico é mais longa hoje.
Rolim: As boas escolas podem, sim, receber alunos de outras
instituições. Também podem receber e enviar docentes, tudo isso está previsto
no regimento de qualquer escola médica e o Ministério da Educação incentiva
essas inciativas. Essa série de idéias que discutimos hoje devem ser
aperfeiçoadas, porque todos ganham.
Luna: Em nome de todos os conselheiros do
Cremesp, agradeço a presença dos senhores nesta Casa. O debate foi excelente e
aprendi muito com os senhores, como era de se esperar. As sugestões que os
senhores trouxeram para esse debate foram muito oportunas e com certeza serão
aproveitadas.
Edição 42 - Janeiro/Fevereiro/Março de 2008
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